Pular para o conteúdo principal

Crônica da semana

 

Direita/Esquerda



Alberto é uma das pessoas mais calmas e equilibradas que conheço. Aquela pessoa que tem sempre um bom conselho, uma palavra e/ou atitude amiga... Um tipo que todo mundo queria ser ou queria ter como amigo. Outro dia colocou o carro na revisão e para chegar ao trabalho chamou um carro de aplicativo. O carro chegou rapidamente, ele entrou e se deparou com um motorista jovem, simpático e com cara de que gostava de papo. Alberto que adora uma conversa pensou logo que a longa viagem até seu local de trabalho, que fica em outro município, seria animada.

- Bom dia! Vamos com ar ou prefere os vidros abertos? – disse o motorista.

- Acho que não está calor, dá pra seguir com vidros abertos mesmo. É mais seguro! – disse Alberto enquanto respondia as mensagens no celular.

A viagem seguia tranquila até que o motorista começou a puxar assunto e, como tudo hoje em dia, caiu na pandemia e consequentemente na política. Alberto conhece bem a saúde, os números, as falhas e tudo mais que se refere à pandemia. Um fala uma coisa, o outro responde, até que o motorista começa a falar que tudo é culpa da esquerda, que isso vem do Marxismo, de Lenin... “Esses comunistas só querem roubar, essa gente quer se dá bem em tudo” e seguiu com aquele discurso claramente comprado de alguém que ele deve admirar muito. Era fácil perceber que ele ouviu alguém falar, incorporou o discurso como verdade absoluta e saiu por aí despejando nos seus passageiros. Alberto retruca algumas coisas, mas prefere deixar o motorista falar porque percebeu que ele não iria entender nada do que ele falaria.

- O senhor não acha que esses comunistas são aproveitadores?

- Não, não acho – responde Alberto. 

- Ao menos agora não tem mais roubalheira. Nosso governo é limpo.

- uhum – responde.

E a conversa vai. De repente eles dão de cara com um engarrafamento. Alberto coça a cabeça, preocupado com seu horário, mas não diz nada. O motorista imediatamente olha para a direita e percebe o acostamento livre. Não pensa duas vezes, arma a seta e vai embora com a velocidade e alegria de quem logo, logo vai deixar seu cliente no trabalho, pegar outra corrida e seguir seu dia.

Alberto coça a barba e pensa em falar, mas resolve permanecer calado. O carro segue pelo acostamento até a saída que levaria Alberto ao trabalho. Um enorme silêncio toma conta do carro. Vira à direita, esquerda, segue e pronto!

- Chegamos rápido! Vou encerrar aqui.  Muito obrigado pela corrida e se quiser deixar uma gorjeta eu agradeço. Desculpa aí pelo acostamento, mas sabe como é, né?!

Alberto não resiste:

- Claro, eu entendo. O vírus comunista às vezes pega vocês também.

O motorista fica vermelho.

- Não é isso, só peguei o acostamento por sua causa, assim o senhor chegou na hora, sem atraso e eu já vou pegar outra corrida. O senhor sabe, né?! Precisamos levar o leite pra casa e as coisas não estão nada, nada fáceis.

Alberto abre a porta e diz:

- relaxa companheiro. A luta é grande!

O motorista arranca o carro com cara de quem ficou bravo.

Alberto entra no prédio pensativo. “Por que será que errado é só o que outros fazem?”.


Foto estudopratico.com.br

 

Comentários