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Psicanalista Renata Bento fala sobre o impacto da pandemia na saúde mental de crianças e adolescentes

A psicanalista Renata Bento afirma que a terapia tem sido bastante procurada nesse período de pandemia. Pacientes se queixam de fadigadas emocionais e famílias têm encontrado dificuldades em lidar com a saúde mental de crianças e adolescentes.

*De que forma a pandemia vem impactando a saúde mental das crianças e adolescentes?  

Renata Bento: Todos estamos sofrendo de algum modo. Para as crianças, dependerá muito de como a família lida com esse sofrimento, essa forma de lidar, recai diretamente sobre elas.  Se existe equilíbrio emocional na família, os efeitos negativos nas crianças, são menores.

Para os adolescentes, as restrições impostas e a dificuldade do entendimento do que isso representa incrementa significativamente o estresse emocional. O adolescente quer sair, ter novas experiências que fazem parte desse processo de crescimento, mas estão mais limitados e isso acaba por ter que adiar encontros, o primeiro beijo, por exemplo. Alguns adolescentes que já tinham dificuldade relacional, acabam por se isolar ainda mais em seus quartos. 

*De que forma os pais podem atenuar essas perdas na convivência com amigos e familiares e a ansiedade nas crianças e adolescentes? É possível? 

Renata Bento: Criando um ambiente afetivo e funcional. Isso significa que não é um ambiente mágico, mas um espaço que caiba conversas das mais diversas, que as crianças possam emitir suas opiniões. E veja bem, emitir opinião não significa controlar o ambiente. Significa ser escutado, ser visto, poder se colocar e receber do ambiente acolhimento e direção. 

*A terapia tem sido bastante procurada nesse período. Depressão, pânico e ansiedade tem sido as maiores dores, nesse processo?

Renata Bento: A terapia tem sido uma grande oportunidade de conversar sobre a tristeza. Claro que houve um aumento nos diagnósticos de depressão ou transtornos emocionais, mas as pessoas têm se sentido fadigadas emocionalmente, cansadas mesmo. Não necessariamente com algum diagnóstico. É que precisam falar sobre suas angustias, seus medos, seus desesperos, até para que não evolua para algo mais grave. A terapia contribui para a elaboração desses sentimentos, desses incômodos emocionais e ao tratar disso, é possível que sobre espaço para a esperança. É poder se sentar ou deitar no divã para falar sobre o que tudo isso representa para ela para depois ficar de pé na vida.  

*Além da perda de pessoas da família, os adolescentes têm perdido experiências, festas de formatura, viagens, encerramento de ciclos. Isso pode ser recuperado de alguma forma? Ou são perdas que vão fazer parte da história dessa geração?

Renata Bento: O passado não dá para mexer. É sempre daqui para frente, no máximo, o passado pode servir como retrovisor para facilitar as ultrapassagens na vida, evitar certas coisas, quando se aprende com a experiência. Essas perdas farão parte dessa geração e cada um terá uma forma singular de elaboração. Essas experiências de perdas, de frustrações, de adiamentos farão parte da experiência de cada um. A pandemia deixará marcas e histórias para contar. 

*As crianças menores também perderam o convívio com os amigos da escola, avós, tios, enfim como resgatar esse processo na pós pandemia. Como ficará, provavelmente, esse momento no processo mental/emocional da criança?

*Renata Bento: Quanto menor a criança, mais suscetível ao ambiente em que vivem. É importante durante esse processo criar um ambiente de conversa, de interação familiar, falar de uma forma em que a criança possa entender, essa forma diferente e atual de se viver.  Evitar passar o desespero para as crianças porque elas ainda não possuem um aparelho psíquico de adulto e tudo cai de uma forma muito dura e direta no mundo emocional delas, ainda que seja externamente imperceptível aos olhos dos adultos. Esse processo de resgate das relações se dará de forma contínua. É importante ressaltar que o distanciamento é físico e não afetivo. Criar formas de manter os laços afetivos dará um sentido de continuidade, de ligação emocional entre o período anterior a pandemia, o durante e o depois.

 

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